RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) – Ian Gouveia vive um sonho após cogitar parar a carreira nas competições. O brasileiro volta à elite do surfe mundial em 2025, depois de seis temporadas no Challenger Series, e celebra o bom momento.
Aos 32 anos, ele carimbou a vaga na etapa da Califórnia, nos Estados Unidos, em agosto, e vai se juntar a nomes como Gabriel Medina, Filipe Toledo e Italo Ferreira.
“Nesse ano eu fui para o ‘tudo ou nada’. Já estava pensando em dar uma parada, em seguir outro rumo, tocar outros projetos, mas tinha minha vaga no Challenger Series. Fui para o tudo ou nada e deu tudo certo. Estou amarradão de estar de volta. Quero mostrar o que eu posso fazer dentro do circuito mundial e tentar buscar o meu espaço”, disse Ian Gouveia.
O retorno à WSL também tem um ingrediente especial. Ele quer realizar com as filhas um pouco daquilo que pôde viver com o pai. Ian, pode-se dizer, é um herdeiro do surfe. Ele é filho de Fábio Gouveia, campeão mundial amador em 1988, em Porto Rico, primeiro título de maior expressão de um brasileiro na modalidade, sendo apontado como precursor do que viria a ser conhecido como Brazilian Storm.
“Quando eu iniciei a carreira, comecei a fazer o circuito mundial, sonhava em entrar no WCT, eu tinha realmente esse sonho de vivenciar o que eu vivenciei com o meu pai. Acompanhei o meu pai no tour, vivenciei muita coisa legal, e tinha essa vontade de proporcionar isso para a minha família, minha esposa, minhas filhas”, disse Ian.
MOMENTO NA CARREIRA
Ian abre um sorriso ao falar sobre a oportunidade de, novamente, disputar entre os melhores do mundo. Ele já esteve neste patamar por duas temporadas em anos anteriores, mas ressalta que, à época, não teve o foco que necessitava.
“É um momento incrível da minha carreira. Eu consegui em 2017 e 2018 participar do tour, mas eu não tinha essa mentalidade de se preparar, ser obcecado por títulos e essas coisas. E, realmente, só caiu a ficha quando eu saí da elite. Ali, vi o que perdi e comecei a correr atrás. De lá para cá foram seis anos, e esse ano foi o ano do tudo ou nada”, disse Ian Gouveia.
O surfista acredita que pode ter a melhor temporada, mas admite uma visão “realista” ao analisar os próximos passos e aponta que isso é um combustível.
“Em termos de competição, sou bem realista comigo mesmo. Tenho noção de que eu estou mais próximo do final da minha carreira do que do início. Então, se eu tenho algo a mostrar, tem de ser agora. Não dá para ficar postergando, estou com 32 anos. Isso foi uma mentalidade que me ajudou a ter os resultados que tive esse ano. Colocar em prática e fazer sem medo de falhar. Ir para as baterias e tentar as melhores manobras possíveis”
OS ‘MOMENTOS’ COM O SURFE
Franco, Ian Gouveia admite que a classificação à elite do surfe mundial aconteceu após um momento de desânimo até mesmo com o próprio surfe. Ele classificou a vida de atleta como “montanha-russa” e salientou a importância da saúde mental para que pudesse seguir em frente.
“É desafiadora a vida de um atleta, não só no surfe. Todo mundo vai passar por um momento difícil, é uma montanha russa. [Foram] Seis anos, muita coisa aconteceu. Tive momentos que nem tinha vontade de surfar, não queria nem entrar na água, ia por obrigação. Mas houve momentos de ficar amarradão, feliz. Tive vários momentos, mas tenho muita sorte de ter uma equipe interdisciplinar incrível, e uma família que viu minha luta diária e sempre me ajudou ”
O atleta revelou estar se recuperando de lesão que aconteceu na etapa em que carimbou a vaga para a WSL. “Em termos de competição, foi o meu melhor ano, mas está sendo um dos mais desafiadores mentalmente porque estou lidando com muitas lesões. Estou fora da água desde agosto, recuperando. Estou fazendo esse esforço pelo meu corpo, para estar zero para o ano que vem”.
O que mais ele falou?
Você volta ao circuito após seis anos. Em que pontos o surfe evoluiu desde então? “Aconteceu muita coisa. Seis anos se passaram e o circuito renovou. Não é aquela coisa do desconhecido, como foi no meu circuito de estreia, em 2017. Vou estar na minha cabeça de igual para igual. Estou super tranquilo e bem mentalmente. E o fator da experiência, agora com 32 anos, mais quilometragem, faz com que eu chegue tranquilo”.
Seu pai é apontado como precursor da brazilian storm. Ele acompanha suas provas, conversa sobre? “É engraçado. Brinco que meu pai nunca foi muito aquele de ficar em cima, era mais minha mãe (risos). Mas, logicamente, meu pai também sempre me colocou no caminho certo. É um privilégio. No começo do ano, quando estava com os pensamentos de, talvez, parar de competir, liguei para ele antes, fiquei horas ao telefone, falei as minhas ideias, o que estava planejando, e ele apoiou”.
E você vai ter novidades na prancha. “Fechei uma parceria para ser um desenvolvedor da Shark Coat, uma start-up que produz uma película que imita pele de tubarão. Vamos usar no fundo da prancha e, realmente, pode revolucionar o mundo do surfe. Comecei a fazer os testes e ajudá-los a colocar na prática. O que essa película pode trazer de benefício é diminuir o atrito com a água, e isso vai gerar mais velocidade. É muito bom para a remada”.
Tem algo ao qual se apegou ao longo desse período em que buscava a vaga? “Sempre busco pegar inspirações em atletas bem-sucedidos. Eu me amarro em assistir esportes. Estou sempre vendo futebol, tênis, Fórmula 1. Gosto de ler biografias, tento aprender um pouco. Eu levo bastante isso para a minha carreira como motivação. Sempre curti muito o Ayrton Senna, uma pessoa em que muitos se inspiram. Mais da atualidade, o Djokovic [tenista]. O Max Verstappen, da F-1, também. Uma coisa que faço como hobby, e também ajudou muito na carreira nesses últimos anos, foi o jiu-jítsul”.
Além do seu pai, tem algum ídolo no surfe? “O Kelly [Slater]. Se o Kelly estava competindo e não era contra o meu pai, estava torcendo por ele. Sou fã mesmo, e tive a oportunidade de entrar no circuito ainda em tempo de competir com ele. Não tive nenhuma bateria homem a homem, só baterias de três atletas. Tirei foto, pedi autógrafo. Eu tenho uma lycra dele que pedi para ele autografar. Está pendurada em casa, enquadrada. No início do ano, na primeira etapa do Challenger, pedi para o Kelly autografar e me classifiquei [ao WSL] com ela”.
ALEXANDRE ARAUJO