“Bora tomar uma!” é o convite que as campanhas publicitárias fazem sempre acompanhada de belas imagens que transmitem sucesso, beleza e alegria. Mas escodem os verdadeiros efeitos que o consumo de bebidas alcóolicas podem ocasionar às pessoas e suas famílias.
Estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que cerca de 50% do risco da dependência do álcool pode ser atribuído a fatores genéticos, incluindo polimorfismos nos genes relacionados ao metabolismo dual, como genes ADH e ALDH, o que podem proteger ou aumentar.
O psiquiatra João Paulo Cirqueira explica como ela age no organismo. “A bebida alcóolica é classificada como um depressor do sistema nervoso central e atua diretamente no sistema de recompensa do cérebro, liberando a dopamina. Essa dopamina é que vai criar a sensação de prazer. Essa liberação da dopamina reforça o consumo repetido, levando à tolerância, isto é, a uma necessidade de se consumir cada vez mais álcool para ter os mesmos efeitos, o que vai levar a dependência”, disse o médico.
Mas, como tratar uma doença que nem todos consideram doença? Superar os comentários que podem minar a coragem para começar um tratamento! O medo, a vergonha são grandes obstáculos e sem apoio da família, igreja, só fica ainda mais difícil.
Uma das portas de entrada para tratamento está dentro das Unidades de Saúde dos municípios, por meio da Rede de Atenção Psicossocial. Os casos graves são encaminhados para atenção especializada e são atendidos nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que, em suas diferentes modalidades, dão suporte para os demais pontos de atenção e realizam o acompanhamento de transtornos mentais graves e persistentes também decorrentes de álcool e outras drogas.
Vitório (nome fictício), hoje com 60 anos, até os 18 não bebia nada, e depois começou a experimentar algumas bebidas fracas e esporadicamente. Quando começou a trabalhar em uma grande empresa, era o mais novo da equipe que se reunia nas folgas e sempre regada a bebida. Aos 23 anos, o que era degustação virou consumo exagerado.
A esposa, percebendo os sintomas, perguntou se poderiam juntos, pedir ajuda. “Fomos até o Hospital das Clínicas, há 37 anos, onde me indicaram o Alcoólicos Anônimos (AA). Fui para o grupo no Centro de Vitória e vi as pessoas contando as suas histórias de vida e me questionei se tudo aquilo ia acontecer comigo”, disse.
Naquele momento, Vitório foi acolhido pelo grupo. “Com a promessa de que ficando no AA eu seria feliz, fiquei com eles e não bebi mais”. Apesar de ter gostado muito, Vitório não continuou frequentando o grupo de apoio, achando que estava recuperado, e um belo dia, voltou a beber socialmente. “Foram 12 anos sem beber, aí eu cometi o erro de tomar bebida. A tragédia voltou muito rápido porque ela estava adormecida dentro de mim”, lembrou.
Nesse momento Vitório entendeu que não existe alcoólico recuperado. “Eu aprendi que temos que dar manutenção a recuperação. As perdas foram grandes, cheguei a separar da família. Meu coração dói quando me lembro de que cheguei a dormir em lugares que jamais pensei. Caia na rua e apagava. É o fundo do poço”, lembrou Vitório.
A doença alcoólica não tem nível social, grau de escolaridade, etnia, é algo que pode acometer qualquer pessoa, como Vitório, que tem formação e especialização de nível superior, mas chegou a dormir na rua embriagado. Por mais qualificado que a pessoa seja, quem vai querer um funcionário que trabalha todos os dias de ressaca, ou embriagado, podendo colocar em risco a sua vida e de outros colegas de trabalho? O integrante da família AA afirma que a doença o deixou sem utilidade.
“Eu perdi a dignidade, felicidade e a utilidade, mas quando voltei a ser eu mesmo, resgatei esses valores”.
AA, clínicas, unidades de saúde: caminhos para tratamento
A Sesa e Secretaria de Estado de Governo (SEG) trabalham com a triagem e acolhimento de pessoas com dependência química no Centro de Acolhimento e Atenção Integral sobre Drogas (CAAD).
O CAAD é um serviço de atenção integral no tratamento e cuidado, visando à redução das diversas vulnerabilidades associadas ao uso abusivo de álcool e outras drogas, por meio de uma equipe multidisciplinar, formada por médicos, assistentes sociais, psicólogos, conselheiros terapêuticos, nutricionista e técnica de enfermagem.
O psiquiatra alerta que o abandono do consumo de álcool é um processo complexo que requer suporte médico, psicológico e social. Deixar de beber sozinho pode ser perigoso, especialmente em casos de consumo prolongado ou intenso, devido ao risco de sintomas graves de abstinência, como convulsões ou delírio.
“É fundamental procurar ajuda profissional para garantir uma recuperação segura e eficaz. Alguns passos são recomendados. Passo número um, reconhecer o problema; Passo dois, buscar ajuda médica e psiquiátrica. Passo três, participar de grupos de apoio. Passo 4, Reorganizar o ambiente e a rotina”, disse o psiquiatra.
De acordo com o psiquiatra, no Brasil estão disponíveis medicações que reduzem o desejo pelo álcool, efeitos relacionados ao consumo e medicação que desencoraja o consumo ao causar efeitos desagradáveis, como náusea, quando o álcool é ingerido.
Rede Abraço
Em 11 anos de existência, a rede já atendeu mais de 20 mil cidadãos nos três centros de acolhimento e atenção sobre drogas na capital, Cachoeiro de Itapemirim e Linhares. Relacionando as linhas de frente de atendimento em enfermagem, medicina, psicologia, psiquiatria, Serviço Social, nutrição e encaminhamentos, são mais de 107 mil atendimentos. Todos gratuitos e sem agendamento.
O subsecretário de Estado de Políticas sobre Drogas, Carlos Lopes, faz um importante alerta ao afirmar que não há resposta simples e universal que dê conta de todos os problemas envolvidos no uso de drogas e dele advindos. “A drogadição é uma temática complexa, visto que não está inserida apenas num único locus. Quando falamos de álcool e outras drogas, estamos diante de uma realidade multifacetada, que requer atenção dos diversos dispositivos sociais, a exemplo da segurança pública, saúde, moradia, emprego e lazer, entre outras questões socioeconômicas.
Por isso, na Rede Abraço trabalhamos fortemente os fatores de proteção social, que são políticas que atuam na reinserção social do indivíduo e no fortalecimento emocional para que haja o protagonismo integral do sujeito. Nosso foco na prevenção, no tratamento e com estudos e pesquisas são de extrema importância para nos subsidiar em relação às estratégias de atuação em rede e, de fato, conseguirmos oferecer o amparo necessário às pessoas e famílias que sofrem com o uso abusivo de substâncias psicoativas. Só assim vamos conseguir proporcionar oportunidades de uma vida melhor e mais lucidez às novas gerações”, afirma o subsecretário.
Se precisar, peça ajuda:
AA (27) 99993 3395 linha de ajuda, 24 horas.
– (Região Metropolitana) – R. Treze de Maio, 47
– Centro CAAD Cachoeiro de Itapemirim (Região Sul) – R. Dr. Raulino de Oliveira, 56
– Centro CAAD Linhares (Região Norte) – Av. Hans Schmoger, 333
– Nossa Sra. da Conceição Telefone de contato: 0800 028 1028 WhatsApp: (27) 3636-6200